Quando o dinheiro derruba o talento: Milka Dunno na Newman Haas e a crise mundial.

Quando o dinheiro derruba o talento: Milka Dunno na Newman Haas e a crise mundial.

Que a crise financeira afetou terrivelmente o automobilismo mundial não é novidade alguma. No que diz respeito ao mercado de pilotos, a Formula Indy parece ser a categoria que mais sofreu conseqüências negativas com o caos que tomou conta do sistema financeiro norte-americano. Se nos últimos anos, os fãs da categoria já estranhavam fatos como o de um piloto de qualidade duvidosa como o japonês Hideki Mutoh, por imposição da Honda, ocupar uma vaga na Andretti Green que é conhecidamente uma das equipes de ponta da categoria, o milionário Canadense Marty Roth que nitidamente não possui capacidade técnica para participar da maioria das provas da Fórmula Indy, ser admitido na categoria, o quê dizer da recente “contratação” da venezuelana Milka Dunno, pela equipe Newman-Haas Lanigan? Não seria algo bizarro se a piloto comprasse uma vaga em uma simpática equipe pequena como a Dale Coyne ou até mesmo se continuasse com a sua vaga na Dreyer & Reynbold, pois estas equipes dependem apenas do dinheiro trazido por patrocinadores de seus pilotos, para poderem participar das corridas. O fato é que mesmo sendo algo sem lógica, uma piloto sem a mínima condição de disputar uma corrida de mopostos de mais de 600hp com a maioria de suas etapas disputadas em ovais, ocupar um cockpit em uma equipe da Formula Indy mesmo sendo uma das menores equipes, definitivamente, se alguém suspeitasse que a Newman- Haas fosse apelar para um piloto pagante, jamais ninguém poderia crer que no caso a piloto, seria justamente o único participante do campeonato, que muita suspeita apresenta quando analisada sua condição de dirigir ou não, um carro de uma categoria top.
Milka Dunno, 36 anos, nasceu em Caracas, capital da Venezuela. Iniciou sua carreira no automobilismo aos 26 anos, correndo na Copa Porsche Venezuelana. De lá para cá, participou de várias categorias, em sua maioria de carros de turismo ou sport protótipos. Conquistou algumas vitórias em várias categorias consideradas de “Gentlemen Drivers”, que são campeonatos similares a nossa Maserati Trofeo aonde a maioria dos pilotos são empresários, milionários buscando diversão e raramente algum reconhecido ex-piloto aposentado. Mais adiante, participou das 24 horas de Le Mans e da American Le Mans, correndo com carros GT ou da categoria LMP 675 de protótipos pequenos. Passou a maior parte de sua carreira correndo na Rolex Sports Car Series, onde ficou famosa quando o Discovery Channel fez um documentário chamado “Milka Dunno a 1000 km/h”, aonde foi possível notar que ela sempre se beneficiou do fato de as corridas de longa duração contarem com mais pilotos dividindo o mesmo carro. Na temporada exibida no documentário, era nítido que o companheiro de Milka, Andy Wallace experiente piloto de endurance e vencedor das 24 horas de Le Mans de 1988, praticamente “carregava Milka nas costas”, além disso, várias vezes a venezuelana tomava bronca de seus chefes e demais integrantes da equipe, pelo fato de se preocupar mais em distribuir autógrafos, posar para fotos, do que com os detalhes importantes para conquistar bons resultados dentro das pistas. Em 2007, com o dinheiro da CITGO (subsidiária da estatal do petróleo venezuelana PDVSA), Dunno consegue comprar uma vaga na Fórmula Indy, sendo que não completa nenhuma prova, na maioria das vezes por ter rodado sozinha, se envolvido em acidentes ou como na corrida de Iowa, aonde os diretores de prova resolveram lhe mostrar a bandeira preta, eliminando-a da prova, pois sua lentidão excessiva representava perigo aos demais pilotos. Já em 2008, Milka continua a sua série de acidentes e rodadas, não participa de várias provas a devido a recomendações da equipe, que prefere que ela teste mais a fim de suprir deficiências técnicas.
O fato é que apenas a pouca experiência em categorias de base, não é a única explicação para os resultados completamente nulos da piloto venezuelana. É sabido que no automobilismo sempre existiram inúmeros casos de pilotos com pouquíssima experiência nos campeonatos de aprendizado, mas que conseguiram muito sucesso quando chegaram nas categorias top. O número de pilotos que conquistaram resultados espetaculares nas categorias de base, mas quando chegaram ao topo não tiveram o rendimento esperado, também é enorme. Muitas vezes observamos pilotos de talento inquestionável, correndo pelas categorias do mundo, mas que em termos de resultados possuem um currículo pobre e nem por isso são considerados maus pilotos. O problema é que Dunno demonstrava dificuldades extremamente brutais relacionadas desde as noções básicas da técnica de pilotagem, até na capacidade de controlar carros de menor potência. Sua carreira sempre pareceu impulsionada pelo marketing que atrai ao seu redor e pelos patrocínios milionários que leva consigo.
Agora após essa rápida análise sobre os méritos de Milka Dunno diante da vaga na Newman-Haas Lanigan, é recomendável darmos uma olhada no quadro de pilotos que já passaram pela equipe desde o seu primeiro ano, ainda na extinta CART a partir de 1983. Nomes como Mario Andretti (Campeão pela equipe em 1984), Alan Jones, Michael Andretti (Campeão em 1991 e recordista de vitórias da extinta CART, tendo conquistado a maioria delas pela Newman-Haas), Nigel Mansell que após conquistar o título mundial de Fórmula 1 pela Williams em 1992, decidiu mudar para a Fórmula Indy e acabou conquistando com a Newman-Haas o título da temporada de 1993 em um dos campeonatos mais emocionantes da história, Paul Tracy que venceu duas provas em 1995 Christian Fittipaldi que conquistou duas vitórias pela equipe, Roberto Moreno, Cristiano Da Matta que conquistou de maneira espetacular o campeonato de 2002, Bruno Junqueira que conquistou cinco vitórias em sua passagem pela equipe, Sebastien Bourdais que é o recordista de vitórias da equipe (empatado com Michael Andretti com 31 vitórias cada) e simplesmente foi o responsável pelo período mais próspero da equipe, conquistando nada menos do que quatro campeonatos consecutivos, Oriol Serviá e (ufa!) mais recentemente Graham Rahal que venceu o GP de St Pete de 2008 (o primeiro da equipe após a fusão da Champ Car com a IRL) e o inglês Justin Wilson que venceu o GP de Detroit de 2008, conquistando a mais recente vitória da equipe.
Observando os nomes acima, acho desnecessárias muitas explicações sobre os motivos do choque que a contratação de Milka Dunno causou naqueles que acompanham a Fórmula Indy há mais tempo. Não há nada o que reclamar, a não ser tomar partido de inconformismo a respeito do rumo que as coisas estão tomando no automobilismo. Uma equipe infelizmente não pode viver apenas das glórias do passado e no momento parece ter sido a única saída para a Newman-Haas, abrir mão de Justin Wilson e ter que colocar dois carros à disposição de pilotos pagantes. No caso do piloto holandês Robert Doornbos, mesmo trazendo consigo muito dinheiro de seus patrocinadores (ING, Trust e Muermanns), restam muitas dúvidas entre os fãs, se o holandês pode ser considerado mesmo um “legítimo” pay driver, tendo em vista que já conquistou duas vitórias e seis pódios pela Minardi na extinta Champ Car.
O que mais entristece com todo esse caso, são os pilotos talentosos que mal conseguem garantir sequer uma vaga sólida na categoria para que possam participar de uma temporada completa. Aliás, parece que é o que mais teremos nesta temporada, inúmeros talentos reconhecidos em equipes pequenas e pobres, sendo que alguns correm até o risco de permanecerem a pé. Thomas Scheckter, Bruno Junqueira, Ryan Hunter-Reay, Buddy Rice, Alex Tagliani, Paul Tracy, Oriol Serviá e Sarah Fisher, são alguns dos nomes de talento reconhecido e que ou estão em equipes de orçamento mais do que limitado com chances remotas de vitórias ou ainda não possuem nada assinado.
Muitos fãs se questionam: “Se Paul Newman estivesse vivo, será que permitiria que a sua equipe chegasse a esse ponto?” Já que a visão do lendário ator diante da formação de uma equipe, era reconhecidamente compromissada com atitudes éticas e centradas.
Difícil pensar em uma resposta. Como fãs desse esporte fascinante, só resta pensarmos positivamente para que as coisas voltem a ser como antes o mais rápido possível.
Ver um potencial adormecido despertar e nos brindar com performances espetaculares, é uma das coisas mais bonitas que esse esporte pode oferecer, mesmo nos tempos em que situações assim ficam cada vez mais raras.

Fabio Henrique é um viciado em automobilismo, principalmente pelas corridas do passado. Piloto de Kart dois tempos desde os 14 anos, estudante de jornalismo e apaixonado por mecânica, espera contribuir com o blog expondo seus pontos de vista. Entre em contato com o Fábio: fabiok15jps@hotmail.com

5 comentários:

Anônimo disse...

Texto fantástico, profissional mesmo. Parabéns, Kart 15!

Anônimo disse...

Realmente, as coisas pra quem gosta de automobilismo estão ficando complicadas! Tanto na Fórmula 1 como na Indy cada dia é uma nova decepção. Esperamos que esta "maré de azar" para os amadores do esporte não demore a passar!

Parabéns pela coluna, muito bem escrita. Até a próxima semana.

Pezzolo disse...

bem mas ela acabou andando mais rápido que o doorbos... vamos dar uma chance pra ela afinal!

Anônimo disse...

Sim, pode ter andando na frente do Doornbos em um teste. Ninguém sabe o que um piloto e a equipe estão fazendo no carro durante um teste. Além do mais, foi o primeiro contato do holandês com um circuito oval.

Dunno pode até ter desempenho melhor do que sempre teve, mas NUNCA, JAMAIS merecia essa vaga na Newman-Haas. Existem centenas de pilotos que mereciam muito mais. É só olhar para os nomes que já correram pela equipe.

Não tem lógica isso, seria o mesmo que a Ferrari contratar o Ide e ele passar a andar regularmente em 10° e sem bater. Será um "salto de qualidade" apenas para ele mesmo. Porque por merecimento jamais entraria na equipe.

Anônimo disse...

E digo mais: Pra quê dar "uma chance" para Milka Dunno, sendo que pilotos muito bons na Indy como Paul Tracy, Thomas Scheckter, Patrick Carpentier, entre outros, não tiveram mais chance?

Em termos de pilotagem que é o que interessa, é inquestionável que ela não chega aos pés de nenhum dos nomes citados. Então pra quê dar chance?

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